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AI, o que vai ser da Física!?
por Óscar Amaro
Aluno do 5º ano de MEFT, Instituto Superior Técnico
N unca a Humanidade esteve tão envolvida no Podemos pensar nisto como um “fit global” a todas as
avanço da Ciência. A cada ano que passa, o variáveis dinâmicas do sistema! Tal como noutras áreas
número de investigadores que publicam em de aprendizagem automática, surge o problema de over-
revistas científicas aumenta cerca de 5% [1]. Apesar fitting, quando o número de termos é demasiado elevado
de este e outros crescimentos (quase) exponenciais e o poder preditivo reduzido. Nesse caso, o método pode
não refletirem realmente o progresso feito, a verdade incorporar a filosofia da navalha de Occam e procurar um
é que nos aproximamos cada vez mais de uma melhor equilíbrio entre a precisão e a simplicidade do alfabeto de
compreensão do Universo nas suas diferentes escalas. Em termos usados. Apesar de tudo isto, este método funciona
paralelo, assiste-se à progressiva automatização de várias apenas em sistemas clássicos e simples, como massa-mo-
tarefas científicas, que, até há pouco tempo, julgaríamos la e pêndulos, que, no fundo, seguem a equação de movi-
impensáveis de implementar em chips. mento de Newton.
A Física é uma ciência profundamente empírica, porque E se quisermos generalizar para outros sistemas físicos?
o objecto de estudo é a própria Natureza! Poder-se-ia pen- Por exemplo, em [4], os autores começam por gerar da-
sar que é preciso um agente consciente para a analisar; dos a partir de um código partícula-em-célula, que funciona
no entanto, é muito frequente os laboratórios modernos por primeiros princípios, nomeadamente as equações de
terem sistemas automáticos de calibração, alinhamento Maxwell. A seguir, constroem um dicionário de operações
e otimização, quase dispensando a intervenção humana. diferenciais sobre a função de distribuição f(x,v,t), e testam
Em concreto, é possível criar algoritmos de controlo que diferentes combinações destes termos até encontrarem a
“aprendem” as correlações entre inputs, como a posição que melhor descreve a evolução do sistema. Neste artigo,
de espelhos e intensidade de um laser, sujeitos a flutu- os autores não só conseguem “destilar” a equação de Vla-
ações, e outputs, como a energia dos electrões acelerados sov com elevada precisão, como também equações de con-
pelo laser num plasma [2]. Até recentemente, esta era tinuidade, momento e energia. Apesar de haver um claro
uma tarefa muito penosa e sujeita a muitos erros e tinha interesse académico em verificar a consistência entre leis
de ser feita por alguém com uma grande dose de intuição micro, meso e macroscópicas já conhecidas, estes méto-
e paciência. Mais, os próprios dados das experiências po- dos poderão ser usados para desvendar novas equações
dem ser catalogados, selecionados e analisados por roti- diferenciais e modelos reduzidos, que poderão ser menos
nas pré-definidas, como é feito com a quantidade abismal exigentes do ponto de vista computacional do que os códi-
de eventos no CERN. gos originais de primeiros princípios.
Sendo assim, é legitimo perguntar se é possível extrair
leis físicas diretamente de dados experimentais? Segun-
do [3], parece que sim. O algoritmo que usaram há mais
de uma década (e cuja área de investigação, entretanto,
evoluiu significativamente) baseia-se na procura de com-
binações de variáveis dinâmicas (e funções delas) que re-
produzam os dados experimentais. Por exemplo, para um
oscilador harmónico simples, o programa encontra termos
sin(x) e cos(x) com coeficientes apropriados, em que x é
a posição do oscilador. Usando invariâncias e simetrias, o
método consegue extrair as equações de movimento do
sistema e até o seu Lagrangiano.
Figura 2: Uma parte de uma das mais de mil de páginas de
Abramowitz e Stegun, Handbook of Mathematical Functions.
Sim, os físicos teóricos decoravam muitas páginas como esta!
Figura 1: Dicionário de variáveis dinãmicas e operadores Falta saber, então, o que fazer com a componente pura-
mente teórica da Física. Se antes era pedido que um inves-
tigador soubesse o Abramowitz e Stegun [5] de trás para
a frente, o cálculo simbólico (como o Mathematica) tirou
esse fardo pesado dos seus ombros, e permitiu-lhe focar-
se na resolução de problemas físicos em vez de decorar
tabelas de integrais. Mesmo assim, este software poderá
um dia ser substituído por redes neuronais [6] e, quem
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